CRISE DE ALIMENTOS
TERRAMÉRICA - O nó górdio da crise alimentar
Por Pascal Lamy*
O consumo mundial de alimentos é conduzido por três motores: crescimento econômico, crescimento demográfico e preferências alimentares, afirma Pascal Lamy neste artigo exclusivo.
Genebra, Suíça, 21 de fevereiro de 2011 (Terramérica).
Por Pascal Lamy*
O consumo mundial de alimentos é conduzido por três motores: crescimento econômico, crescimento demográfico e preferências alimentares, afirma Pascal Lamy neste artigo exclusivo.
Genebra, Suíça, 21 de fevereiro de 2011 (Terramérica).
Apenas superada a crise dos alimentos de 2008, o mundo entra em outra fase de preços altos. Agora, a carestia alimentar estimula a inflação global, sem mencionar sua influência no mal-estar político que chegou a graus inquietantes em vários países. Os preços alcançaram um recorde em dezembro de 2010, em relação a 2008, segundo a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO).
Ao contrário do ocorrido em 2008, um fator fundamental parece estar em jogo agora: o mau tempo. No ano passado, as compras no mercado futuro de trigo nos Estados Unidos subiram 47%, incentivadas por uma série de eventos climáticos, como a seca na Rússia e em seus vizinhos do Mar Negro. Embora as restrições de fornecimento sejam o principal culpado por esta crise, existem outras razões.
O consumo mundial de alimentos é conduzido por três motores: crescimento econômico, crescimento demográfico e preferências alimentares. A mais extraordinária inovação é que o consumo de alimentos também é impulsionado pela produção de energia. Ao empregar biocombustíveis em nossos sistemas de transporte estamos jogando fora milho, cana-de-açúcar e outros cultivos comestíveis.
A organização para a Cooperação e o Desenvolvimento (OCDE) e a FAO estimam que, se as atuais políticas continuarem, em 2019 cerca de 13% da produção mundial de grãos grossos, 16% do óleo vegetal e 35% da cana-de-açúcar serão usados na produção de álcool combustível vegetal, ou etanol. Em nível mundial, a renda sobe e continuará aumentando, embora de forma desigual. Com o aumento da renda vem o aumento da demanda.
Por outro lado, as taxas de crescimento da população desaceleraram há 30 anos, e agora estão abaixo de seu pico no final da década de 1960. Porém, mantém-se um crescimento firme da população mundial. Em escala global, as preferências alimentares convergem por várias razões, como o aumento do consumo de carne e de produtos lácteos, em particular no mundo em desenvolvimento.
A produção mundial será capaz de atender esta crescente demanda? Há três fatores principais de crescimento da produção de cereais: expansão das áreas agrícolas, aumento da frequência dos cultivos e técnicas para intensificar os rendimentos, como mecanização e irrigação, além da biotecnologia. A agricultura também continuará dependente da flutuação dos preços do petróleo, cujo aumento encarece os fertilizantes e a distribuição dos produtos.
Os fatores que influem na produção e no consumo estão vinculados com o comércio internacional, que equilibra a oferta e a demanda, transportando produtos de zonas onde há excedente para outras deficitárias. Contudo, quando este mecanismo se altera pelas barreiras comerciais, a turbulência ameaça os mercados. As restrições à exportação têm um papel importante na crise.
Há outras barreiras comerciais prejudiciais – as tarifas e os subsídios – que impedem que os alimentos sejam produzidos onde o seriam com maior eficiência. Entretanto. as restrições à exportação têm um papel muito direto no agravamento das crises. Elas levam pânico aos mercados quando diferentes atores veem que os preços aumentam à velocidade da luz. Isto ocorreu durante a explosão dos preços do arroz em 2007-2008, quando não havia nenhum desequilíbrio fundamental nos mercados.
Igualmente, o aumento atual dos cereais tem muito a ver com as restrições às exportações da Rússia e da Ucrânia, que foram afetadas por fortes secas. Essas restrições têm uma lógica: os Estados que as aplicam não querem que suas populações passem fome. De modo que a pergunta é “quais são as alternativas?”. A resposta pode ser um incentivo maior à produção global, mais redes de previdência social, mais ajuda alimentar e, possivelmente, mais reserva de alimentos.
Também a Rodada de Doha sobre negociações comerciais mundiais pode ajudar para uma resposta de médio e longo prazos à crise alimentar, mediante a remoção de muitas restrições e distorções que prejudicam o panorama dos abastecimentos. A Rodada da Organização Mundial do Comércio pode reduzir os subsídios de países ricos que, em certas matérias-primas, colocam obstáculos intransponíveis à produção do mundo em desenvolvimento.
O pior tipo de subsídio, o subsídio às exportações, deveria ser completamente eliminado. Também deveriam baixar as tarifas alfandegárias, embora com certas flexibilidades, para atender o acesso do consumidor aos alimentos. Junto com estas medidas, precisamos de maiores investimentos na agricultura. E, em particular, devemos preparar nosso sistema agrícola para enfrentar a iminente mudança climática, da qual, provavelmente, seremos testemunhas. Isso será vital para melhorar o panorama dos abastecimentos.*Pascal Lamy é diretor-geral da Organização Mundial do Comércio. Direitos exclusivos IPS.
Crédito da imagem: Claudius
Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação dos Programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e para o Desenvolvimento (Pnud), realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.
(Envolverde/Terramérica)
Ao contrário do ocorrido em 2008, um fator fundamental parece estar em jogo agora: o mau tempo. No ano passado, as compras no mercado futuro de trigo nos Estados Unidos subiram 47%, incentivadas por uma série de eventos climáticos, como a seca na Rússia e em seus vizinhos do Mar Negro. Embora as restrições de fornecimento sejam o principal culpado por esta crise, existem outras razões.
O consumo mundial de alimentos é conduzido por três motores: crescimento econômico, crescimento demográfico e preferências alimentares. A mais extraordinária inovação é que o consumo de alimentos também é impulsionado pela produção de energia. Ao empregar biocombustíveis em nossos sistemas de transporte estamos jogando fora milho, cana-de-açúcar e outros cultivos comestíveis.
A organização para a Cooperação e o Desenvolvimento (OCDE) e a FAO estimam que, se as atuais políticas continuarem, em 2019 cerca de 13% da produção mundial de grãos grossos, 16% do óleo vegetal e 35% da cana-de-açúcar serão usados na produção de álcool combustível vegetal, ou etanol. Em nível mundial, a renda sobe e continuará aumentando, embora de forma desigual. Com o aumento da renda vem o aumento da demanda.
Por outro lado, as taxas de crescimento da população desaceleraram há 30 anos, e agora estão abaixo de seu pico no final da década de 1960. Porém, mantém-se um crescimento firme da população mundial. Em escala global, as preferências alimentares convergem por várias razões, como o aumento do consumo de carne e de produtos lácteos, em particular no mundo em desenvolvimento.
A produção mundial será capaz de atender esta crescente demanda? Há três fatores principais de crescimento da produção de cereais: expansão das áreas agrícolas, aumento da frequência dos cultivos e técnicas para intensificar os rendimentos, como mecanização e irrigação, além da biotecnologia. A agricultura também continuará dependente da flutuação dos preços do petróleo, cujo aumento encarece os fertilizantes e a distribuição dos produtos.
Os fatores que influem na produção e no consumo estão vinculados com o comércio internacional, que equilibra a oferta e a demanda, transportando produtos de zonas onde há excedente para outras deficitárias. Contudo, quando este mecanismo se altera pelas barreiras comerciais, a turbulência ameaça os mercados. As restrições à exportação têm um papel importante na crise.
Há outras barreiras comerciais prejudiciais – as tarifas e os subsídios – que impedem que os alimentos sejam produzidos onde o seriam com maior eficiência. Entretanto. as restrições à exportação têm um papel muito direto no agravamento das crises. Elas levam pânico aos mercados quando diferentes atores veem que os preços aumentam à velocidade da luz. Isto ocorreu durante a explosão dos preços do arroz em 2007-2008, quando não havia nenhum desequilíbrio fundamental nos mercados.
Igualmente, o aumento atual dos cereais tem muito a ver com as restrições às exportações da Rússia e da Ucrânia, que foram afetadas por fortes secas. Essas restrições têm uma lógica: os Estados que as aplicam não querem que suas populações passem fome. De modo que a pergunta é “quais são as alternativas?”. A resposta pode ser um incentivo maior à produção global, mais redes de previdência social, mais ajuda alimentar e, possivelmente, mais reserva de alimentos.
Também a Rodada de Doha sobre negociações comerciais mundiais pode ajudar para uma resposta de médio e longo prazos à crise alimentar, mediante a remoção de muitas restrições e distorções que prejudicam o panorama dos abastecimentos. A Rodada da Organização Mundial do Comércio pode reduzir os subsídios de países ricos que, em certas matérias-primas, colocam obstáculos intransponíveis à produção do mundo em desenvolvimento.
O pior tipo de subsídio, o subsídio às exportações, deveria ser completamente eliminado. Também deveriam baixar as tarifas alfandegárias, embora com certas flexibilidades, para atender o acesso do consumidor aos alimentos. Junto com estas medidas, precisamos de maiores investimentos na agricultura. E, em particular, devemos preparar nosso sistema agrícola para enfrentar a iminente mudança climática, da qual, provavelmente, seremos testemunhas. Isso será vital para melhorar o panorama dos abastecimentos.*Pascal Lamy é diretor-geral da Organização Mundial do Comércio. Direitos exclusivos IPS.
Crédito da imagem: Claudius
Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação dos Programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e para o Desenvolvimento (Pnud), realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.
(Envolverde/Terramérica)
Fonte: Blog do Luis Nassif.
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