WikiLeaks: O plano de Washington para constranger o governo brasileiro usando a mídia Tradução do Coletivo da Vila Vudu WikiLeaks Viewing cable 09BRASILIA1435 – Excerto do item CONFIDENCIAL do telegrama 09BRASILIA1435A íntegra do telegrama não está disponível.Tradução de trabalho, não oficial, para finalidades didáticas.ASSUNTO:Estratégia para Engajar o Brasil na “Difamação de Religiões”[1] 1. (C) RESUMO: A posição do Brasil na questão da “difamação de religiões” na comissão de Direitos Humanos da ONU reflete a conciliação entre as objeções do país à ideia (objeções baseadas num conceito do que sejam Direitos Humanos) e o desejo de não antagonizar os países da Organisation of the Islamic Conference (OIC) com os quais tenta construir relações e que o Brasil vê como importante conjunto de votos a favor de o Brasil conseguir assento permanente no CSONU. À luz da argumentação a favor da abstenção do Brasil, proponho abordagem de quatro braços, envolvendo aproximação com os altos escalões do Ministério de Relações Exteriores; uma visita a Brasília, para pesquisar meios de trabalhar com o governo do Brasil, nessa e noutras questões de direitos humanos; outros governos que possam conversar com o governo do Brasil; e uma campanha mais intensa pela mídia e mobilizando comunidades religiosas a favor de não se punir quem difame religiões . FIM DO RESUMO. Contexto: “Quando Direitos Humanos e ambição de chegar ao Conselho de Segurança entram em choque”. 2. (SBU) Essa embaixada levantou várias vezes a questão dos votos do Brasil no Departamento de Direitos Humanos e Temas Sociais do Ministério das Relações Exteriores. A última vez foi com a chefe do Departamento Ministra Glaucia Gauch. O Brasil nunca discordou de um único argumento dos que apresentamos em outros encontros. A resposta sempre foi a mesma: o conceito de difamar religiões é repugnante. Repugna aos valores e princípios do Brasil e é inconsistente com a legislação brasileira e a legislação internacional. Por isso o Brasil não pode aprovar e não votará a favor de resolução que proíbe que se puna quem difama religiões. O Brasil abstém-se de votar. 3. (C) Perguntada sobre por que o Brasil não vota contra a resolução, dado que a considera absolutamente inadmissível, Gauch respondeu que o país entende que a abstenção é suficiente. Na opinião do Governo do Brasil, o país assume posição baseada em princípios, mas também prática, porque não interessa ao país ofender os países da Organização da Comunidade Islâmica, sobretudo os mais poderosos como Iran, Egito, Turquia e Arábia Saudita, países com os quais o Brasil tenta aprofundar relações. É opinião dessa embaixada que o que mais interessa à política externa do Brasil é conseguir um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU. Como resultado, o Governo do Brasil prefere não antagonizar países e grupos de países cujos votos podem ser valiosos numa futura eleição. Abordagem de quatro braços4. (SBU) À luz dessa realidade complicada, proponho abordagem de quatro braços no caso do Brasil, sobre essa questão. Antes de qualquer das etapas e movimentos, deve-se declarar o compromisso dos EUA com o diálogo e a cooperação, e nosso empenhado esforço para manter o Brasil como um líder e um parceiro nessa questão. Encontros de alto nível: Ao abordar os mais altos níveis do Ministério de Relações Exteriores, é essencial persuadir o Brasil a mudar seu voto e a trabalhar conosco a favor da “Difamação de Religiões”, até chegarmos a uma solução de conciliação. Telefonema da Secretária de Estado dos EUA ao Ministro Amorim das Relações Exteriores, logo depois da recente carta enviada por ela, demonstraria a importância que os EUA damos a essa questão. Também se deve abordar o vice secretário-geral do MRE ministro Antonio Patriota; e o subsecretário Burns deve abordar a subsecretária para assuntos políticos, embaixadora Vera Machado (que supervisiona questões de direitos humanos e política das organizações internacionais), o que muito ajudaria a aumentar a importância do tema na cabeça dos brasileiros (sic). Só as abordagens nos níveis inferiores dificilmente conseguirão modificar a abordagem “em cima do muro” [orig. Brazilbs hands-off approach] dos brasileiros sobre o assunto. Um Diálogo sobre Direitos Humanos: Uma visita dedicada exclusivamente a essa questão, seria, na minha opinião, de pouco efeito, porque o Brasil aceita as premissas de nossa objeção. Ao mesmo tempo, uma discussão mais detalhada dos nossos pontos de vista e de nosso plano de ação, com níveis operacionais e político do MRE seria valiosa. A abordagem mais efetiva (e, no longo prazo, mais valiosa para os interesses mais amplos do Governo dos EUA) poderia incluir a questão atual na pauta de um novo diálogo regular sobre direitos humanos, ideia que o próprio MRE (pelo emb. Patriota) propôs recentemente. O contexto mais amplo de um esforço para trocar ideias e para encontrar vias pra trabalharmos mais próximos do Governo do Brasil no campo dos direitos humanos nas organizações internacionais (tratando também, talvez, de outras das preocupações dos países chaves, incluindo o Irã e a Coreia do Norte, questões sobre as quais o Brasil sempre se abstém) criariam um fórum ideal para discussões e para conseguir que o governo do Brasil apóie o plano de ação proposto pelos EUA. Essa abordagem ampla seria atraente para os brasileiros, interessados em construir parcerias com os EUA, que ajudarão a validar o desejo de que o Brasil passe a ser visto como líder internacional. Essa abordagem seria mais bem recebida que abordagem focada, dirigida só à questão da difamação de religiões. Abordagem por outros países: Desde que chegou ao cenário internacional, o atual governo do Brasil tem tido grande cuidado para não alinhar suas políticas às políticas dos EUA. O Brasil tem em alta conta o que considera como sua posição “de ponte” entre países em desenvolvimento e países desenvolvidos, por causa de sua disposição de falar com todos os países. Minha opinião é que essa posição tende a limitar o peso das opiniões dos EUA dentro do Governo do Brasil. Porque o Brasil vê-se ele mesmo como se fosse líder no bloco dos países latinoamericanos, esses países pouco conseguirão influenciar as ideias do governo do Brasil. O mais provável é que ouçam outros países que consideram ‘independentes’ [aspas no orig.] dos EUA, como África do Sul, Rússia, China, Índia e França. Ganhar o apoio para nossa posição de alguns membros da Organização da Conferência Islâmica, especialmente do Egito, Turquia e outros ‘independentes’[aspas no orig.] influentes seria muito importante para que consigamos influenciar o voto do Brasil a favor da difamação das religiões. Em geral, abordagens feitas por qualquer outro país que apóie ação proposta pelos EUA servem como prova da natureza colaborativa de nossos esforços e podem ser úteis. Aumentar a atividade pela mídia e o alcance das comunidades religiosas parceiras: Até agora, nenhum grupo religioso no Brasil assumiu a defesa da difamação de religiões. Mas o Brasil é sociedade multirreligiosa e multiétnica, que valoriza a liberdade de religião. Um esforço para difundir a consciência sobre os danos que podem advir de se proibir a difamação das religiões pode render bons dividendos. Grandes veículos de imprensa, como O Estado de S. Paulo e O Globo, além da revista Veja, podem dedicar-se a informar sobre os riscos que podem advir de punir-se quem difame religiões, sobretudo entre a elite do país. Essa embaixada tem obtido significativo sucesso em implantar entrevistas encomendadas a jornalistas, com altos funcionários do governo dos EUA e intelectuais respeitados. Visitas ao Brasil, de altos funcionários do governo dos EUA seriam excelente oportunidade para pautar a questão para a imprensa brasileira. Outra vez, especialistas e funcionários de outros governos e países que apóiem nossa posição a favor de não se punir quem difame religiões garantiriam importante ímpeto aos nossos esforços. Essa campanha também deve ser orientada às comunidades religiosas que parecem ter influência sobre o governo do Brasil, quando se opuseram à visita ao Brasil do presidente Ahmadinejad do Irã, em novembro. Particularmente os Bahab e a comunidade judaica, expandidos para incluir católicos e evangélicos e até grupos indígenas e muçulmanos moderados interessados em proteger quem difame religiões [sic]. [assina] KUBISKE [1] Há matéria da Reuters sobre o assunto, de seis meses antes desse telegrama, em http://www.reuters.com/article/2009/03/26/us-religion-defamation-idUSTRE52P60220090326, em que se lê: “Um fórum da ONU aprovou ontem resolução que condena a “difamação de religiões” como violação de direitos humanos, apesar das muitas preocupações de que a condenação possa ajudar a defesa da livre expressão em países muçulmanos (sic)” [NTs]. PS do Viomundo: Na época em que foi feito esse comunicado, a Organização das Nações Unidas (ONU) estava para votar uma resolução condenando a “difamação de religião”. Os EUA eram contra. Defendiam que não deveria ser considerado crime difamar religiões e queriam mudar o voto do Brasil, que era pela abstenção. No dia 26 de março de 2009, a ONU aprovou a resolução condenando a “difamação da religião”, como uma violação dos direitos humanos. Desde 1999, essa questão vai e volta à pauta da Comissão de Direitos Humanos da ONU.
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