quarta-feira, 22 de junho de 2011

O ROMBO DOS HOSPITAIS ADMINISTRADOS PELAS OSS EM SÃO PAULO


Hospitais públicos de SP gerenciados por OSS: Rombo acumulado é de R$147,18 milhões

por Conceição Lemes

A saúde pública no Estado de São Paulo está sendo privatizada rapidamente, a passos largos.

O símbolo desse processo são as OSS: Organizações Sociais de Saúde. Significa que o serviço de saúde é administrado por uma dessas instituições e não diretamente pelo Estado.

Curiosamente no site da Secretaria Estadual de Saúde não há sequer uma lista com todos os hospitais, ambulatórios médicos de especialidades (AMEs) e serviços de diagnóstico administrados por OSS. É preciso garimpar na internet, nome por nome, para saber se o serviço X ou Y é tocado por OSS. É desafio até para pessoas acostumadas a pesquisar em Diário Oficial. Mas quem se der a este trabalhão – às vezes é preciso telefonar ao estabelecimento para ter certeza–, vai comprovar o óbvio: a terceirização, de vento em popa, da saúde pública do Estado de São Paulo.
O artifício é a lei complementar nº 846, de 1998, alterada pela 62/2008, do ex-governador José Serra (PSDB), que autoriza transferir às OSS o gerenciamento de todos os hospitais públicos paulistas, novos e antigos.
“Os hospitais gerenciados por Organizações Sociais são exemplo de economia e eficiência”, diz o site da Secretaria Estadual de Saúde.
A justificativa para a expansão das OSS é “a experiência de sucesso dos últimos dez anos”. Essa, especificamente, foi anexada ao projeto de lei que Serra encaminhou à Assembleia Legislativa paulista, permitindo às OSS gerenciar não só os novos estabelecimentos de saúde (como permitia a legislação em vigor desde 1998) mas também os já existentes (até então era proibido).
Artigo publicado no boletim EnBreve, do Banco Mundial, também derrama elogios às OSS.
ROMBO ACUMULADO DE 18 HOSPITAIS CHEGA A R$147,18 MILHÕES
Teoricamente as OSS são entidades filantrópicas. Na prática, porém, funcionam como empresas privadas, pois o contrato é por prestação de serviços.
“As OSS recebem os hospitais absolutamente aparelhados, de mão beijada. Tudo o que gastam é pago pelo governo do estado ou prefeitura. Além disso, recebem taxa de administração”, avisa o promotor Arthur Pinto Filho, da área de Saúde Pública do Ministério Público de São Paulo. “Entregar a saúde pública para as OSS evidentemente encarece a saúde e tem prazo de validade.”
No final do ano passado, o Viomundo já havia tornado público que, em 2008 e 2009, os hospitais geridos pelas OSS custaram, em média, aos cofres do Estado de São Paulo cerca de 50% mais do que os hospitais administrados diretamente pelo poder público. A mesma tendência se manteve em 2010, revela o cruzamento de dados dos relatórios das OSS com informações do Sistema de Gerenciamento da Execução Orçamentária do Estado de São Paulo (SIGEO)
No final de 2010, o Viomundo também revelou que, de 2006 a 2009, os gastos com as OSS saltaram de R$ 910 milhões para R$ 1,96 bilhão. Uma subida de 114%. No mesmo período, o orçamento do Estado cresceu 47%. Ou seja, as despesas do Estado de São Paulo com a terceirização da saúde cresceram mais que o dobro do aumento do orçamento público.
Mas a situação é bem mais complicada. O Estado de São Paulo tem 34 hospitais públicos geridos por OSS. Alguns são por meio de convênios, feitos normalmente com fundações de universidades públicas. A maioria é por contratos de gestão, geralmente executados por instituições privadas ou filantrópicas.
Até o início de junho, 22 dos 34 hospitais públicos do estado de São Paulo geridos por OSS haviam publicado balanço referente a 2010.
Desses 22, apenas quatro ainda têm patrimônio positivo. Um deles é o Hospital Brigadeiro, na capital paulista, privatizado em janeiro de 2010 e gerido pela Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina, conhecida pela sigla SPDM. Os demais são os hospitais Regional Porto Primavera (Rosana), Estadual João Paulo II (José do Rio Preto) e Regional de Presidente Prudente (antigo Hospital Universitário). Todos novos e administrados pela Associação Lar São Francisco de Assis na Providência de Deus.
Os outros 18 hospitais apresentaram patrimônio negativo, ou seja, passivo maior do que o ativo. Portanto, dos que já divulgaram o balanço de 2010, 80% estão “quebrados”.
Atente bem à tabela abaixo. Ela foi elaborada com base em pesquisa feita nos balanços publicados no Diário Oficial do Estado de São Paulo.
Resultado: Em 2010, o déficit desses hospitais foi de R$ 71,98 milhões. Mas o rombo acumulado dos 18 chega a R$ 147,18 milhões.
70% DOS EQUIPAMENTOS GERIDOS POR OSS TIVERAM DÉFICIT EM 2010
O sinal vermelho foi dado nos próprios balanços. Sobre o do Hospital Estadual do Itaim Paulista, gerido pela Casa de Saúde Santa Marcelina, a Cokinos & Associados Auditores Independentes S/S adverte:
“Conforme descrito na Nota Explicativa n.º 14, a Entidade apresentou déficit de R$ 3.227.700 durante o exercício findo em 31 de dezembro de2010 e, naquela data, o seu passivo total, excedia o seu ativo total em R$ 3.804.984. A Organização dependerá do repasse de verbas complementares futuras afim de obter o reequilíbrio econômico-financeiro para a manutenção normal de suas operações.”
A situação dos ambulatórios médicos de especialidades (AMEs) também é muito grave. Dos 27 existentes, 17 tiveram déficit em 2010. Entre eles, o AME Heliópolis (antigo Hospital Heliópolis), administrado pelo Seconci-SP (Serviço Social da Construção Civil do Estado de São Paulo).
Em 2009, esse AME, que ironicamente se chama Dr. Luiz Roberto Barradas Barata, tinha patrimônio de R$ 3,8 milhões. Porém, devido ao déficit de R$ 6 milhões em 2010, seu passivo já atinge R$ 2,2 milhões. Barradas, ex-secretário da Saúde do Estado de São Paulo e falecido em 2010, foi o autor da justificativa anexada por Serra à mensagem enviada, em novembro de 2008, à Assembleia para mudar a lei das OSS.
Resumo do buraco: dos 58 hospitais, AMEs e serviços de diagnóstico do estado de São Paulo geridos OSS por contrato de gestão, 41 tiveram déficit em 2010, segundo o relatório das OSS publicado no Diário Oficial do Estado de São Paulo, publicado em abril de 2011. O que representa 70%.
SECONCI, SPDM E FUNDAÇÃO ABC NÃO RESPONDEM
Esta repórter contatou as OSS responsáveis pelos hospitais com déficit para saber o motivo dessa situação.
O Seconci-SP não respondeu, apesar de diversos telefonemas e emails para a sua assessoria de imprensa. O Seconci administra os hospitais Geral de Itapecerica da Serra, Estadual de Vila Alpina, Regional de Cotia, Estadual de Sapobemba e AME Heliópolis. Por meio de convênios com a prefeitura de São Paulo, também cuida de cinco AMAs (unidades de Assistência Médica Ambulatorial). Abaixo resumo do balanço do Estadual de Vila Alpina.
A SPDM, ligada à Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) não quis se manifestar. Por meio de sua assessora de imprensa, disse que só a Secretaria Estadual de Saúde poderia dar esclarecimentos. A SPDM gerencia nove hospitais no estado de São Paulo, sendo quatro estaduais: Brigadeiro e Geral de Pirajussara, na capital, Luzia de Pinho Melo, em Mogi das Cruzes, e Estadual de Diadema.
A Casa de Saúde Santa Marcelina achou melhor que o diretor de cada hospital esclarecesse o déficit.
“Há vários motivos para o prejuízo no ano que passou, mas o principal, responsável por mais de 90% dessa situação, é o orçamento inadequado. Como aconteceu em 2010, 2009 e alguns outros anos anteriores, as partes negociavam já sabendo que o dinheiro não seria suficiente para cobrir as metas de atendimento”, explica a esta repórter Carlos Alberto Ferreira, diretor do Hospital Estadual Itaim. “Só que, geralmente lá por setembro, outubro ou novembro, se reviam os valores e um termo aditivo de contrato era assinado para cobrir a diferença. Em 2010, devido à morte do doutor Barradas e mudança de secretário, isso não aconteceu plenamente. Daí por que o dinheiro não deu.”
Já a responsável pelo Hospital Estadual de Itaquaquecetuba não quis falar. Recomendou-me contatar a assessoria de imprensa da Secretaria Estadual de Saúde.
A Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo é gestora de vários serviços de saúde estaduais, entre os quais os hospitais Geral de Guarulhos, Estadual de Francisco Morato, Estadual de Franco da Rocha “Dr. Albano da Franca Rocha Sobrinho”, Centro Hospitalar do Sistema Penitenciário e o Centro de Atenção Integrada à Saúde Mental de Franco da Rocha – Complexo Hospitalar do Juquery.
Resposta ao Viomundo: “No ano passado, parte dos recursos foi contingenciada. Atualmente a situação está equilibrada”.
A Associação Congregação de Santa Catarina, do qual o Hospital Santa Catarina faz parte, administra dez instituições públicas paulistas: os hospitais gerais de Pedreira, Itapevi e Grajaú, o Centro de Referência do Idoso da Zona Norte, o Pólo de Atenção Intensiva em Saúde Mental, os AME Jardim dos Prados, Itapevi e Interlagos, o Centro de Análises Clínicas de São Paulo (Ceac) e Serviço de Diagnóstico por Imagem (Sedi 1).
Resposta ao Viomundo:
“Está havendo uma negociação junto ao governo do Estado para adequação entre orçamento e metas assistenciais para 90% das casas administradas pela Associação.
Nos últimos 3 anos (2009, 2010 e 2011), o governo do Estado tem basicamente mantido as metas assistenciais e reduzido os orçamentos em 5% a cada ano, por conta de um contingenciamento. Portanto, nos últimos três anos houve uma redução de 15% no orçamento e as metas foram as mesmas.
Os Hospitais Pedreira e Itapevi apresentaram um déficit, pois os recursos não estão condizentes com as metas estipuladas. Sendo assim, a Associação Congregação de Santa Catarina, assim como outras entidades filantrópicas, está em negociação com o governo do Estado para alinhar o orçamento às metas ou as metas ao orçamento”.
Abaixo o resumo do balanço do Hospital de Pedreira.
CONTRATOS GARANTIDOS NO FIO DO BIGODE? BAIXA TRANSPARÊNCIA
Acontece que o Hospital Estadual de Pedreira, por exemplo, realizou em 2010 menos do que o foi contratado:
Ou seja, esse hospital gerido pela Associação Congregação Santa Catarina realizou quase 8% a menos das metas físicas contratadas. Porém, recebeu R$ 5,6 milhões a mais do que o valor previsto, como mostra a tabela abaixo feita com base no levantamento no Diário Oficial. Já os hospitais Itapevi e Grajaú, administrados pela mesma OSS, receberam praticamente o valor contratado.
Os hospitais Estadual de Guarulhos e de Francisco Morato, administrados pela Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, receberam a mais R$5.474.3815,50 e R$1.040.706,00, respectivamente.
Detalhe: Pedreira, Guarulhos e Francisco Morato não são exceção; em geral, há acréscimos nos valores contratados inicialmente.
Afinal de contas, o governo paulista realmente contingenciou recursos, como alegam algumas OSS? Tecnicamente recurso contingenciado é aquele previsto no orçamento e o governo congela. Ele pode vir ou não a ser repassado.
Ou as OSS não receberam o que desejavam pelos serviços prestados?
Ou será que, para ganhar a eleição estadual em 2010, o governo tucano teria estimulado as OSS a atender mais do que o previsto e posteriormente não cobriu os extras?
Ou será tudo isso junto?
Qual a mágica para as OSS continuarem operando, já que a maioria dos hospitais geridos está no vermelho? Teria o atendimento piorado ou elas resolveram fazer benemerência, trabalhando de graça para o governo estadual?
Os contratos seriam para “inglês ver”, considerando que, de antemão, as partes sabem que precisarão de aumento posterior nos valores?
A garantia seria mesmo na base de um “fio do bigode” de uma única pessoa?
O fato é que, apesar envolver recursos públicos de quase R$ 2 bilhões anuais, o negócio das OSS é uma caixa-preta que precisa ser escancarada à luz do sol de verão. Por uma razão simples: falta transparência.
Esta repórter solicitou à assessoria de imprensa da Secretaria Estadual de Saúde São Paulo o número e os nomes dos hospitais geridos diretamente pelo Estado e por OSS, tanto por contratos de gestão, quanto por convênios. Vieram apenas os números e desta forma:
Cerca de 40?! Cerca de 30?! Como?!
Se a Secretaria Estadual de Saúde não sabe EXATAMENTE quantos hospitais são geridos pelo Estado e quantos são por OSS, quem vai saber? Ou será que não nos quis passar?
E supondo que a Secretaria Estadual de Saúde não soubesse quantos hospitais são geridos pelo Estado e quantos são por OSS – que é uma informação básica –, como vai fiscalizar os serviços e cumprimento de metas?
Insisti com a assessoria de imprensa. Precisava dos nomes dos hospitais. Em vez da resposta, foi encaminhado texto só com elogios ao modelo de OSS. Alguns trechos:
Reforcei o pedido, solicitando os nomes dos hospitais geridos por OSS por contrato de gestão e por convênio e os administrados diretamente pelo estado diretamente. Argumentei ser informação básica, de fácil acesso, pelo menos ao pessoal da Secretaria Estadual de Saúde. “É só ‘puxar’ no computador”, esta repórter argumentou na solicitação. Nada. Silêncio absoluto.
Só que os hospitais de Pedreira, Vila Alpina, Itaim Paulista, Mário Covas, Pirajussara e Diadema estão “quebrados”, lembram-se da tabela no início desta reportagem? O rombo acumulado de cada um é, respectivamente, de R$ 5,78 milhões, R$ 8,86 milhões, R$ 3,8 milhões, R$ 4,2 milhões, R$ 13,8 milhões e R$ 11,3 milhões.
Situação oposta à do Instituto do Câncer do Estado, o Icesp, inaugurado em 2008 e gerido pela Fundação Faculdade de Medicina. Seu balanço de 2010 ainda não foi publicado. Mas, segundo o relatório das OSS publicado no Diário Oficial do Estado de São Paulo, o Icesp teria recebido em 2010 R$ 369 milhões. Porém, só gastou R$ 242 milhões. Por que os R$ 127 milhões restantes não teriam sido gastos? A sua utilização não teria aumentado o número de pacientes tratados?
“Cadê o exemplo de economia, eficiência e excelência de gestão?”, muitos leitores devem estar perguntando. E com razão. Afinal, é como as OSS são “vendidas” pelo governo paulista e demais defensores desse sistema de administração.
Tais qualidades, na verdade, parecem ser mais marketing publicitário do que realidade. Pelo menos são os indícios dos números atuais.
Tem mais. A lei da transparência e de responsabilidade fiscal exige que as execuções orçamentária e financeira sejam disponibilizadas em tempo real na internet. Obriga, ainda, o estado a prestar esclarecimentos sobre os seus contratos para qualquer cidadão.
Porém, não há um site que reúna informações sobre os contratos e aditivos celebrados entre as Organizações Sociais de Saúde e o governo paulista. Muito menos que comunique o quanto e em quê estão sendo gastos os recursos.
Apesar das reiteradas solicitações, esta repórter não recebeu da Secretaria Estadual de Saúde até a postagem desta reportagem a lista com os nomes dos hospitais geridos diretamente pelo Estado e os por OSS.
Por que não divulgar? Seria por que o rombo acumulado das OSS paulistas, incluindo hospitais, AMEs e serviços de exames, é bem maior dos que os quase R$ 147, 18 milhões dos 18 hospitais citados?
A propósito. O desmantelamento, na semana passada, da quadrilha formada por médicos, enfermeiros e dentistas do Conjunto Hospitalar de Sorocaba, que desviava verbas dos plantões médicos e fraudava licitações, mostrou a ausência de controle sobre os recursos financeiros e os serviços prestados pelos hospitais públicos paulistas geridos pelo Estado.
Essa mesma falta de controle existe sobre as OSS. Basta ver o crescente déficit dos hospitais estaduais gerenciados por essas entidades. Aliás, se não existe transparência plena sobre um dado tão banal como a lista dos nomes dos serviços de saúde gerenciados por OSS, o que pensar sobre as informações referentes à aplicação dos recursos e aos atendimentos prestados?
Em tempo 1: O esquema de fraude em licitações e nos pontos de plantões médicos (profissionais recebiam sem trabalhar), revelado pela polícia de São Paulo na semana passada, envolveu, além do Conjunto Hospitalar de Sorocaba, funcionários de outros 11 hospitais da região de Sorocaba. Entre eles, o Hospital Geral de Itapevi, administrado por uma OSS, a Associação Congregação de Santa Catarina. O Viomundo contatou a assessoria de imprensa para saber o que a entidade tinha a dizer sobre o fato. Não houve retorno.
Em tempo 2: O médico e ex-secretário de Esporte, Cultura e Lazer Jorge Pagura, que teve o seu nome ligado ao esquema de fraude do Centro Hospitalar de Sorocaba, é chefe da neurocirurgia do Hospital Mário Covas, em Santo André. no ABC paulista. O serviço é gerenciado por outra OSS, a Fundação ABC. O Viomundo contatou a assessoria de imprensa para saber sobre o motivo do déficit acumulado de R$ 4, 2 milhões do hospital. Ela foi uma das entidades que não nos respondeu.
Em tempo 3: Solicitamos à Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo uma avaliação sobre a situação financeira dos hospitais estaduais geridos por OSS. A assessoria de imprensa também não nos respondeu isso.
Quaisquer que sejam as respostas dessas e demais perguntas, esta repórter e os milhões de cidadãs e cidadãos de São Paulo querem saber: quem vai pagar a conta?

quinta-feira, 9 de junho de 2011

FORA MICARLA

Do Blog "De Olho no Discurso", reproduzo:

@rvianna: Natal ferve com #ForaMicarla9
O povo nas Ruas: #ForaMicarla

Por Daniel Valença*
O Rio Grande do Norte e sua capital se notabilizaram nacionalmente, nos últimos anos, por não seguir a tendência no Nordeste de perda de poder das antigas oligarquias e expansão de setores de esquerda e centro-esquerda. Fomos o único estado do NE a garantir a eleição do DEM em 2010 e de um senador que remonta aos períodos ditatoriais – José Agripino Maia. Na Assembléia Legislativa e na Câmara da capital, contam-se nos dedos os parlamentares de esquerda e centro-esquerda. Porém, destas veias já jorraram a Intentona Comunista – por poucos dias, é verdade, mas revolucionária em 1935 – ; o governo Djalma Maranhão e o início do processo educacional revolucionário de Paulo Freire, dentre vários outros momentos históricos para o país.



Em um momento em que o Oriente Médio e a Europa fervem, aqui em Natal, estudantes, militantes políticos, partidários ou de movimentos sociais, cidadãos descontentes, ocuparam a Câmara Municipal da cidade desde a tarde do dia 07 de junho, recuperando a história de luta e deixando claro às elites locais que nosso povo não se constitui em uma massa amorfa, sem rosto e sem voz, como em algum momento lhes pareceu.



O movimento #ForaMicarla #XoInseto acumula as lutas contra os aumentos de passagens, abusivos e realizados na calada da noite, os ataques ao SUS, à educação e outras áreas sociais protagonizados pela prefeita, os debates travados nas redes sociais e a rejeição popular à prefeita do PV, que apresenta índices comparáveis à imbatível Ieda Crusius-PSDB do nosso outro Rio Grande. Após vários atos, finalmente ocupou-se a Câmara Municipal com a reivindicação do impeachment da mandatária. A ocupação estava sendo transmitida pelo twitter, www.foramicarla.com, mas o sinal perdeu-se… ou foi cortado? Do outro lado, a grande mídia majoritariamente tem abordado o movimento de maneira negativa.



Para além dos rumos que o movimento tomará, já é possível indicar alguns elementos essenciais desse processo:



1.Ao contrário das mobilizações populares espanholas recentes, em nosso processo há um diálogo entre as “novas formas de militância” (nas redes sociais) e as históricas em movimentos sociais e partidos de esquerda – diálogo tenso, às vezes beirando o rompimento, inclusive ainda não dado, porém, que manteve a unidade de ação até o momento;



2.Mais uma vez, comprova-se que a mídia comercial não nos contempla e não exerce sua função democrática – Micarla de Sousa, por exemplo, detém a filial do SBT no RN, herdada de seu pai, ex-senador. E, de outro lado, é latente que precisamos organizar nacionalmente uma rede de comunicações alternativas – e a esquerda tem que buscar ao máximo a unificação para tanto – em que cada militante, cada movimento social possa acessar e difundir rapidamente os acontecimentos, por mais que o twitter já cumpra em parte esse papel;



3.A gestão da Prefeitura do Natal não mudará se Micarla for derrubada – ela apenas representa uma aliança empresarial que tomou para si o Estado, como ficou claro, à época, em editorial do Jornal de Hoje, que afirmava terem os empresários derrotado o prefeito Carlos Eduardo. Advindos dos setores empresariais da saúde, dos transportes, da construção civil e da educação, é este arco que explica o porquê da Prefeita terceirizar/privatizar o SUS; aumentar as passagens em finais de expedientes, vésperas de feriados e sem debate púbico sobre a planilha de gastos das empresas; ter tentando alterar o Plano Diretor por decreto, dentre outras medidas. Não foi sua incompetência, apenas, mas tudo isso é o resultado das forças que a financiaram e ela as representa. Em uma democracia fundada na representatividade, são esses setores que devem ser derrotados em 2012 para que ocorram mudanças reais na cidade;



4.Os últimos acontecimentos na Europa e no Brasil – veja-se o caso da aprovação do Código Florestal – revelam que a democracia representativa está falida. Tanto o movimento #ForaMicarla como os demais de todo o país têm que se unificar para uma alteração não apenas das regras eleitorais – e aí é um grande passo o financiamento público de campanha, que não apenas diminuirá o lobby e a corrupção de empresas financiadoras de campanhas multimilionárias, como proporcionará que, para além de empresários, latifundiários e oligárquicos, estudantes, sindicalistas, ativistas e outras lideranças tão legítimas, quanto as primeiras, também tenham boas chances eleitorais, e fidelidade partidária/voto em lista – como também uma refundação da democracia baseada na participação popular direta – ou seja, que o povo realmente decida seus caminhos.



Fica a pergunta, porque não adotarmos o mandato revogatório, como a Bolívia o fez? Se a prefeita goza de mais de 70% de reprovação, porque o povo que lá a colocou não a pode tirar? Por que não regulamentar o referendo e o plebiscito, para que antes de privatizacoes e outras decisoes de afronta ao interesse nacional tenhamos o pronunciamento da vontade popular?

Que o povo decida.



*Daniel Araújo Valença, professor de Ciência

segunda-feira, 6 de junho de 2011

A FASE MAIS VIRULENTA DA AGENDA NEO-LIBERAL
Do Blog do Miro:

Por Rui Namorado Rosa, no sítio português O Diário:



O memorando de “entendimento” que é imposto a Portugal pela troika PS-PSD-CDS coligada com a troika FMI-BCE-CE é gerador de um cenário de desastre, tanto pela evidente penalização social com que atinge a vida da população portuguesa em geral (poupando a grande burguesia que detém as grandes fortunas, os principais meios de produção, e os principais cargos de direcção), como pela regressão económica em que o país se encontra e que a “estruturação” aprofunda ainda mais, como também, por conduzir inevitavelmente (como se fosse o seu propósito) ao incumprimento perante os credores da dívida externa (por força das condições leoninas do empréstimo). A aceitação deste “entendimento” representaria um duro golpe à soberania do país e às suas capacidades e condições socioeconómicas por largos anos.



Não parece crível que os principais actores desta encenação não retirem a mesma conclusão quanto à insolvência do país a prazo, caso este “entendimento” avance. Mas pelos vistos o capital nacional-internacional está mesmo apostado ou é isso mesmo que tem em mente - levar por diante esta agressão ao nosso povo (com as conhecidas conivências políticas nacionais), que significaria um verdadeiro saque de dinheiro (fruto do trabalho e do roubo de direitos constitucionais dos portugueses) e de património (empresas, terras, o que quiserem comprar ou levar por conta, com a cumplicidade do trio PS-PSD-CDS). Deixando o país aprisionado numa dívida ainda maior.



Entretanto, o governo acelerou já a aplicação de cortes e congelamentos do financiamento ao sistema científico e tecnológico nacional, designadamente para Laboratórios de estado, Unidades de investigação universitárias, projectos de investigação científica e desenvolvimento experimental, e bolsas de investigação. O que significa o prosseguimento do caminho que vinha sendo seguido há já alguns anos, mas precipitando o seu agravamento futuro, ilustrando aquilo que o “entendimento” prevê no que toca à redução de “despesas” e do “peso” da administração pública (central e autónoma). Não obstante os slogans do “choque tecnológico”, do “compromisso com a ciência” e outras mais campanhas de relações públicas (depois de já esgotadas também as da “sociedade do conhecimento”, da “paixão pela educação”, etc.).



A desarticulação da capacidade científica e técnica do estado serve bem os interesses do grande capital; reduz a capacidade de intervenção do estado em matéria de planeamento, regulamentação, licenciamento, administração; liberta a decisão política da crítica técnica; facilita o negócio do outsourcing; liberta quadros qualificados para oportunidades de negócio a custos flexibilizados; etc. Os milhares de doutorados, arvorados pelo governo em bandeira da modernidade e da prosperidade do país – mas sacrificados neste pretendido saque de saldo - sabem bem quanto pesa o trabalho precário, as condições de trabalho adversas, a incompetência de gestores por conta de um governo retrógrado e corrompido, a falta de financiamento para produzirem, a falta de oportunidades e a emigração forçada.



A vertente científica e técnica do “estado mínimo” não é nada inocente, é duplamente negativa – para a economia e para a administração pública. A economia nacional (sobretudo as PME) perde apoios especializados da parte do estado. E a população fica exposta à ignorância e a abusos que a fragilizam; desde os riscos naturais, a segurança e protecção quotidianas (obras públicas e edificação, produtos alimentares e farmacêuticos, redes de águas e sanitárias, riscos tecnológicos, etc.). Tudo a favor do grande capital sem escrúpulos.



O “entendimento” poderia fingir fazer sentido se fosse no quadro de um sistema financeiro internacional previsível ou estacionário. Porém, o “entendimento” conduz em linha recta à atrofia do sistema económico nacional, já caracterizado por enormes dependências alimentar e energética, sufocando a sua capacidade de resposta. Então, no quadro externo instável e resvaladiço de crise sistémica, sujeito a rupturas e preços descontrolados de bens alimentares e de combustíveis, um provável agravamento do contexto externo de aprovisionamento terá repercussão catastrófica na economia e nas condições de vida dos portugueses, também inflacionando ainda mais a divida externa. Esta vulnerabilidade não pode ser ignorada, ela é um risco adicional iminente, o do efeito multiplicador da crise internacional para o plano interno.



O capitalismo procede em Portugal (como na Grécia, Irlanda e possivelmente noutros países mais da UE) à sua consabida missão de extracção de mais-valia e de acumulação de capital, mas agora e aqui por outra via, designadamente o negócio do saque financeiro (chantagem e agiotismo). Tal como na Líbia procede entretanto ao saque (dos valiosos recursos do subsolo – hidrocarbonetos e água potável, e dos fundos e reservas das empresas do estado e do banco central) pela via violenta da guerra (ilegal e não declarada).



O capitalismo é uma máquina de exploração de configuração variável e tentacular. O presente saque e a ameaça do seu aprofundamento, aqui em Portugal, servirá sinistramente como uma fonte de financiamento da actual guerra contra a soberania e o património do povo Líbio? Esta é a agenda neoliberal na sua fase mais virulenta.

Postado por Miro

PERU E A GUINADA À ESQUERDA

 PERU E A GUINADA À ESQUERDA NA AL


Por Altamiro Borges



A vitória de Ollanta Humala nas eleições deste domingo tem um significado que transcende as fronteiras do Peru. Ela confirma a guinada à esquerda da América Latina – continente que foi laboratório da devastação neoliberal nos anos 1980/1990 e que hoje é a vanguarda mundial na luta pela superação deste modelo destrutivo e regressivo. Tariq Ali, no livro “Piratas do Caribe”, e Emir Sader, na obra “A nova toupeira”, descrevem com maestria esta virada histórica.



Esta onda progressista, marcada pela centralidade da disputa eleitoral, teve início com a vitória de Hugo Chávez, um militar rebelde, em dezembro de 1998. Na sequência, ela continuou produzindo cenas inusitadas na região – como a eleição de um líder operário no Brasil (Lula), de nacionalistas na Argentina (Nestor e Cristina Kirchner), de um líder indígena e camponês na Bolívia (Morales), de representantes de organizações guerrilheiras na Nicarágua, El Salvador e Uruguai, de um teólogo da libertação no Paraguai (Lugo), de um economista de esquerda no Equador (Correa).



A derrota dos neoliberais



O Peru expressa bem esta mudança do quadro político na região. No governo de Alberto Fujimori (1990-2000), o país foi vítima de uma cruel ditadura, que implantou a força o modelo neoliberal. Diante da resistência popular, ele deu um golpe, fechou o Congresso Nacional, interveio na Justiça e ampliou seu mandato. No final, com o país devastado – via privatizações e exclusão social –, Fujimori foi acusado de corrupção e hoje cumpre pena de 23 anos de prisão.



Os seus sucessores, Alejandro Toledo (2001-2006) e Alan Garcia (2006-2011), porém, deram continuidade ao projeto neoliberal. Com base no saque das riquezas minerais, a economia até cresceu, mas não beneficiou a população mais carente. Os ricos ficaram mais ricos, e os pobres afundaram na miséria. Como afirmou Ollanta Humala, já com a vitória garantida, a sua eleição foi um recado dos peruanos que não aceitam mais as injustiças sociais.

PÓS GRADUAÇÃO

As atualizações do Blog estão comprometidas devido a Pós Graduação que estou fazendo e a grande quantidade de atividades que esta pós requer, mas na medida do possível farei postagens. Abraço a todos que  derem a honra de visitar este espaço.